segunda-feira, maio 27

Nota XX - da sucessão

Talvez o que aconteceu foi uma sucessão de mal entendidos nunca esclarecidos. Uma sucessão de atitudes questionáveis que nunca se deram o trabalho de explicar-se para ninguém. Talvez o que aconteceu foi o resultado de uma única ação mal calculada, que sem querer gerou um mal estar desnecessário. Eu não parei para pensar numa possibilidade, porque tudo parecia fazer sentido dentro daquele circo sem propósito.


Mas talvez o que aconteceu foi só uma sucessão idiota de mal entendidos. E o tempo já passa e transforma as perguntas em dúvidas caladas.


Eu não tenho mais saco, mesmo.

sábado, maio 25

Amanhã o agorá sera difícil

Era difícil olhar pra dentro. Depois de todo aquele tempo, voltar a pensar na rotina que talvez o esperasse era demais. Voltar a pensar nos dias meio vividos, nas noites meio dormidas; voltar a pensar nos sonhos meio esquecidos era demais para ele. Era difícil olhar para dentro quando se sabia que o que estaria lá era exatamente tudo que não suportaria ter de volta nem metade do que tivera. 

Aquele coração não aguentaria meias migalhas de vida.

Era difícil olhar-se no espelho. Não era possível que depois de todo aquele tempo ele ainda se parecesse tanto consigo mesmo. Quem não o olhasse nos olhos não veria diferença, a menos que ele sorrisse. Quem não o olhasse nos olhos não enxergaria todas as coisas que agora ele via diferente; teriam de esperar pelo momento em que ele sorrisse para verem que a cor estava mudada. Era difícil olhar-se no espelho porque depois de tanto tempo ele esperava ter mais reflexos do que era na sua aparência externa. 

Agora ele tinha um coração que não aceitava meias migalhas. 

Seria difícil de encarar as pessoas e dizer que não poderia ficar. Ou fazer. Mas elas não sabem o quão impossível seria viver a vida de antes. Entre julgamentos e vitorias ele encontrou um caminho que lhe deu paz; a ideia de dar um passo para trás era mais do que ele poderia suportar. Sem meia felicidade, sem meia alegria - queria tudo como fosse, desde que viesse inteiro.


Depois de todo esse tempo vivendo consigo, seria impossível ignorar a si mesmo.


quinta-feira, maio 23

Tarda

Ela deitou os olhos nas fotos, retirou os suspiros do peito e expulsou alguns nós da garganta. Ela engoliu. Ela guardou as fotos naquela pasta dentro de outra pasta porque não queria tê-las ao alcance dos olhos - que já vinham cansados das coisas que, confessava, ela mesma procurava ver. Ela deitou os olhos nas fotos, e estas colaram memórias em sua mente; mentira dizer que havia ficado no passado.

Ela deitou o corpo na cama. Que agora recebia só o corpo dela. Ela deitou o corpo na cama, largou os braços ao lado do corpo e respirou um pedaço de lembrança. Assistiu àquela noite como uma cena de filme; assistiu ao mesmo ato de novo e de novo. Ela deitou o corpo na cama e largou os braços ao lado, porque agora havia espaço - e não havia outro corpo.


Ela nao devia ter dito que estava exausta. Agora tarda.

domingo, maio 19

A r[d]espeito

Foi a respeito de todas as outras tantas coisas que vem a tona quando alguem aperta o gatilho; quando alguém inicia a reação. É como uma onda; é como um feixe de luz. Você não pode parar até que a coisa atinja todos os limites que possam contê-la. Barreiras simples são vencidas, obstáculos são contornados; a onda segue até que o limite seja atingido, até que o espaço seja tomado. Aquilo foi sobre todas as outras coisas que vieram junto com a abertura de uma porta.

Todos aqueles dias foram a minha onda.

E aquela sombra e aquela falta de sorrisos foram a minha maneira de lidar com tudo que foi desencadeado. Foi a minha maneira de tentar conter a reação dentro de mim. Todos aqueles dias foram a respeito dos meus problemas de uma vida inteira somados as bobagens que você fez, misturando um estresse agendado com uma falta de clareza, com uma dúvida idiota. Tudo aquilo não foi sobre você, ou sobre o seu jeito ridículo de não lidar com as coisas. Todos aqueles dias e todas aquelas coisas foram a respeito do meu jeito burro de lidar com a minha vida.

Você já pode deixar de ser tão babaca e me olhar nos olhos de novo.

segunda-feira, maio 6

Volta e meia

Sorriu tímida e desnorteada, porque não esperava te encontrar ali. Ela olhou em volta procurando as palavras pra te dizer, mas o ar estava cheio de um nada meio grande - que ocupava tanto espaço quanto podia. Sorriu em resposta ao buraco que se abriu sob os pés dela quando te viu vindo; quando te viu seguindo pro lado de la.

Ela sorriu tímida, desnorteada depois de dançar a ciranda que você resolveu brincar.



Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar.
- se ao menos você desse a meia volta.

quarta-feira, maio 1

Poema sujo

Eu queria escrever um poema sujo; daqueles cheios das coisas que eu deveria ter dito quando você estava assim - tao perto. Eu queria escrever as frases que eu não te disse, versar os movimentos que nós não fizemos e desenhar no papel o percurso que as tuas mãos faziam em sincronia com o meu embalo.

Eu queria usar aquela história que você me contou um dia.

Mas eu acabei tendo que escrever um poema forte, feito de versos crus. Feito de linhas que discordam e se contradizem, onde felicidade não rima com sinceridade e nem com amizade. Eu queria escrever uns versos cheios da nossa liberdade, mas da tua atitude me veio choque. Te fez em vaidade.


Então agora eu vou escrever uns versos sobre a tua sujeira, sobre a tua maneira; e vou fazer poema do teu desamor.