domingo, março 18

Sobre gavetas

Esvaziou prateleiras, arrastou móveis pelo quarto, rearrumou gavetas e esperou pelo melhor. Não que tivesse motivos para isso, mas achou que esperar por coisas boas fosse o mais esperto a se fazer. Achou que pensar em encher-se de tralhas de novo não traduzia o que queria para si dali em diante. E ela queria mais é ter espaço para os próprios pensamentos, em algum lugar do mundo. Que fosse nas gavetas, se preciso.

Encontrou tanta coisa empoeirada que preferiu nem pensar duas vezes. Tudo pro lixo. Pra fora do quarto. Pra fora da vida inteira. Queria todo o espaço para os devaneios, para os planos infalíveis. Queria que as coisas velhas abandonassem de vez as gavetas, que tudo que não tivesse mais utilidade se fosse. Encontrou CDs velhos, bonequinhas de pano, anotações irrelevantes e muita tralha que nem sabia para o que servia. Entre tanta coisa inútil, encontrou  alguns pedaços de coração; foi quando percebeu que eram os que estavam lhe faltando. Essa foi a única coisa em velha e empoeirada da qual não se desfez. Achou melhor deixá-los guardados, até que chegasse a hora de usar um coração inteiro de novo, para alguém que merecesse tanto.

E sabe, ela tinha um bom coração. Eu não vejo a hora de vê-la usando-o inteiro mais uma vez. Quem sabe ele nem precise ser quebrado de novo.



Mas, por enquanto, uma parte ainda vai ficar na gaveta.

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