quinta-feira, março 8

Doce rotina

Desconfortavelmente ele a observava andando de um lado para o outro da casa. Sempre levantava da cama cedo para acompanhá-la no café da manhã, e depois deitava-se no sofá do corredor; com o corpo mal acomodado, olhava os sapatos de salto fazendo toc-toc pelo assoalho. Ela não tinha tempo para lhe dar atenção aquela hora, mas esforçava-se para ao menos afagar-lhe os cabelos e sorrir, amável.

Não importava que o sofá era velho e tinha montes de molas soltas, ou que o estofado já estava meio puído e lhe dava alergias: aquele, de manhã, era o melhor lugar da casa. Era o lugar de onde ele via a mulher mais linda do mundo arrumar-se antes de sair, por onde ela passava primeiro com os cabelos desalinhados para passar de volta com um penteado elegante e o melhor perfume da vida. Ele pouco se importava se era cedo demais, desconfortável demais; era o melhor momento do dia.

A cada mês o sofá parecia menor. Ela, sempre mais linda. Toda vez um torcicolo, um espirro, mas também as melhores lembranças de um tempo bom. O menino acompanhava a mãe sem perder a hora nem mesmo um dia, pois sabia que cresceria e deixaria de dar bola para coisas como aquelas. Aquelas coisas maravilhosas, como o toc-toc do sapato misturado com o cheiro de morango e roupa limpa; a vista do sofá era mais linda que qualquer pôr-do-sol. Era sol nascente. Era a mãe dele.


Ele sempre soube que era um menino de sorte.

0 pessoa(s) disse(ram) que: