sábado, setembro 10

Coletora de prantos

Ela o encontrou sob efeito de um choro sentido, magoado. Estendeu os braços e amparou os olhos úmidos com seu lenço perfumado, sentou-se ao lado do corpo choroso do amigo e deu três tapinhas nas costas do pobre - como se dissesse "eu sei, eu sei". Ele sabia que ela não sabia o porquê de nada, mas confortou-lhe o fato de ela saber o quanto ele precisa dela naquele momento. 

[Em tantos momentos.]

Ela tinha certeza de que tristezas precisam ser divididas, mas não sabia como fazer para dividir as suas. Ela não queria também a tristeza dos outros, mas a tirava dele e a jogava fora - para longe de ambos. Tristeza já basta a própria - ela não se tornaria uma colecionadora de lágrimas alheias. Ela não choraria o teu choro, mas aliviaria a tua dor. 



Havia métodos de livrar as pessoas das coisas tristes - métodos que nunca funcionaram com ela - mas eram eficientes com outros corações. Com ele, usava um especificamente: escrevia as dores do amigo e enviava para um endereço qualquer, sem destinatário nominado, e sem esperança de que chegasse a qualquer lugar. Mandava para longe para ter certeza de que a carta se perderia no caminho. Escreviam juntos os prantos doloridos e, então, um deles estaria livre do pesar. Ela enrolava a carta e selava um episódio sofrido de alguém. Alguém que não era ela.

Nenhum método nunca lhe fizera efeito. Esforçava-se, visivelmente, mas a menina não sabia dizer o quanto doía o que. Ela tentava e punha-se a rabiscar o papel, mas o voto de silêncio da mão não deixava nada sair de dentro dela. As canetas não escrevem nada além do que os dedos dizem. Mas os olhos choram muito mais do que a consciência entende. Ela ainda não aprendera a abrir o coração para alguém que pudesse retirar de lá o peso das lágrimas.

[Por isso ela segue sorrindo desse jeito que você conhece.]

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